25 de novembro de 2009

Crônicas de Ester: ÁUREA


Áurea
Se perguntassem para Áurea qual era sensação que ela estava sentindo naquele exato momento; se houvesse alguém ali além dela para que a pergunta pudesse ser feita, ela diria que não saberia explicar. Era diferente do que havia vivido até então, uma mistura de euforia com tristeza e medo. Tudo estava longe de lhe parecer familiar, pôde constatar com a aparição de uma mulher. Primeiro transparente, mas depois se tornou tangível:
_ Olá, Áurea! – Disse a mulher – Chamo-me Lady Morte e sou sua guia para o Outro Mundo.
Estranhamente, dessa vez, Lady parecia estar de muito bom humor. Sua tradicional roupa negra tinha sido trocada por um leve vestido branco. Os cabelos enfeitados por uma fita negra estavam distribuídos em um penteado seguro; seus cachos estavam presos por um coque
_ Eu vi você! Esteve comigo, pouco antes de chutarem o banquinho que me impedia de ser enforcada! Depois, disso não lembro o que aconteceu...
_ Isso mesmo! Estive contigo no seu ultimo momento de vida. – Lady apontou para o corpo pendurado à sua frente.
Os lábios rosados da Morte se alargaram num sorriso. Até mesmo sua maquiagem forte tinha sido abandonada. Seus olhos negros até pareciam ter vida, dessa vez; apesar de serem duas pedras totalmente negras onde não se podia definir o que era esclera e íris.
Áurea levou suas mãos até o rosto e chorou; primeiro devagar e depois forte e mais alto:
_ Eu não acredito que fizeram isso comigo! Que me mataram de verdade. – Enxugou o pranto com a manga prata de seu vestido.
Lady contorceu seu rosto numa expressão de pena:
_ Oh, minha criança – Aproximou-se – Eles fazem isso mesmo! Matam uns aos outros e sempre me dão trabalho.
Áurea caminhou até seu corpo que balançava com o vento. Ele estava suspenso no ar e seguro por uma corda dourada.O banquinho que haviam chutado tinha desaparecido, assim como todas as pessoas que assistiram aquele espetáculo:
_ Quero reviver! Ouvi histórias desde criança de um homem que morria e ressuscitava todos os dias! É possível reviver, não é? – A jovem encheu-se de esperança.
Morte lhe respondeu:
_ Sim, é possível. Não sou eu quem pode lhe ajudar, porque minha função é constatar o fim da vida não o contrário!
_ Quem pode então?
_ Você saberá no momento oportuno. Se deseja mesmo voltar a viver; se é essa a sua real vontade, ele virá até você!
_ Lady, espere! Aonde vai? Vai me deixar aqui, sozinha?
_ Você não quer ir para o Outro Mundo, não é? Então não tenho mais nada para fazer aqui, Áurea!
Lady Morte desapareceu da mesma maneira que havia se feito: seu corpo tangível foi ficando transparente até que desapareceu por completo.
A jovem Áurea tinha os cabelos prateados florescentes, lisos, que lhe escorriam pelos ombros. A pele tinha agora uma coloração brilhante-prateada. Ela havia se tornado um fantasma, como nas histórias que havia ouvido do Exército Azul derrotado pelos homens do Soberano:
_ Lady! Lady – Gritou em vão a jovem. – Volte! – Se ajoelhou vencida embaixo do seu próprio corpo pendurado sem vida.
_ A Morte vem uma vez só na vida!
_ Quem disse isso? – Áurea se levantou veloz.
Atrás da copa de uma árvore se revelou um homem de cabelos compridos. Vestia-se de colete negro e capa lhe cobria as costas. A calça preta se estendia até as botas de couro negro:
_ Fui eu quem disse!
Áurea se mostrou impressionada:
_ Como pode me ver? – Ela se afastou.
_ Eu sou Frys, o Mágico! – Ele abriu a mão e uma rosa prateada se formou em sua palma – Qualquer um poderia vê-la, milady!
_ Mas estou morta...
_ Ah sim, é verdade. – Ele fez a rosa desaparecer – Mas tua beleza é tanta que é impossível não notá-la.
Se Áurea não estivesse tão pálida, teria corado nas bochechas.
_ Jeito doloroso de morrer – Fryz se aproximou e tocou com a mão o pé descalço do corpo de Áurea – Lamento.
Áurea fantasma abaixou sua cabeça, mas o mágico mudou de assunto:
_ Tenho que seguir meu caminho, bela dama! As vilas estão cheias de crianças para assistirem os meus shows! Tenho uma vida inteira para desfrutar!
_ Espere! Deixe-me ir contigo! Estou só e não sei para onde ir!
_ Teu lugar é no Outro Mundo! – Frys fez um sinal de cruz com os dedos para Áurea – Mas se não quer aceitar o fim, não me importo de tê-la como companhia.
Áurea não disse nada. Preferiu seguir o mágico em silêncio. Só que este silêncio não tardou muito para ser quebrado por Frys. Ora ele cantava, ora declamava poemas que não rimavam. Vez ou outra fazia aparecer rosas na palma de sua mão. Cada vez que fazia isso, a rosa aparecia de cor diferente.
_ Se eu ainda tivesse meu cavalo, poderia chegar bem mais depressa até a vila. Perdi-o na minha ultima mágica quando o fiz desaparecer! Até hoje não consegui fazê-lo reaparecer – Comentou ele.
_ Você é maluco!
_ Com todo o respeito milady, mas não sou eu que não aceitou a morte. – Sorriu ele, fazendo aparecer na palma de sua mão uma rosa amarela.
Áurea preferiu não responder. Contudo Fryz continuou:
_ Qual é sua graça?
_ Áurea.
_ Bonito nome.
_ Obrigada.

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